A recuperação de créditos tributários é uma estratégia crucial para empresas do setor de armazenagem que desejam otimizar suas finanças e reduzir a carga tributária. Além de reaver valores pagos indevidamente de ISS (Imposto Sobre Serviços), essa prática pode resultar em economia contínua no pagamento de impostos futuros. Antes da efetivação da reforma tributária, ainda é possível que recintos alfandegados se livrem da incidência de ISS sobre a armazenagem. Essa oportunidade pode ser uma das últimas chances de ressarcimento de ISS indevido, antes que esse imposto deixe de existir com a iminente reforma tributária.
1. Incidência do ISS sobre a “Armazenagem”
Empresas que atuam no armazenamento em portos secos e aquáticos frequentemente se deparam com a tributação do ISS sobre suas atividades. No entanto, há uma oportunidade significativa de recuperação de créditos nesse cenário.
Estamos abordando a questão do Imposto sobre Serviços (ISS), que é recolhido por diversos recintos alfandegados, portos secos ou aquáticos, em relação a uma atividade específica conhecida como “armazenagem”. Vale ressaltar que não estamos nos referindo à situação geral, na qual o ISS incide, pois na maioria das atividades não há uma clara separação entre a locação e a prestação de serviços. Essa distinção está expressamente prevista no item 20.01 da lista de serviços da Lei Complementar 116/03, que é a norma geral que trata do ISS. Nesse dispositivo, há menção à tributação de serviços portuários pelo ISS, incluindo a armazenagem de qualquer natureza.
O texto legal aponta claramente para a maioria dos casos portuários, nos quais as atividades são misturadas ou não dissociadas entre os serviços e a locação ou cessão. Além disso, a LC 116 também faz referência aos portos em geral, sem detalhar especificidades das realidades de alguns portos que também funcionam como recintos alfandegados. Essas particularidades exigem análise caso a caso.
No contexto do ISS, é relevante destacar o fundamento doutrinário principal, que se baseia nos trabalhos do saudoso professor Aires Fernandino Barreto. Esses estudos contribuíram para que o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovasse a Súmula Vinculante 31 em 4 de fevereiro de 2010.
O instituto da Súmula Vinculante (SV) representa o entendimento uniforme e incontestável que o Supremo Tribunal Federal (STF) constrói a respeito de determinada matéria, com base em diversos precedentes no mesmo sentido proferidos pelo próprio tribunal (RE 455.613 AgR, RE 553.223 AgR, RE 465.456 AgR, RE 450.120 AgR, RE 446.003 AgR, AI 543.317 AgR, AI 551.336 AgR, AI 546.588 AgR, RE 116.121, no caso específico do Imposto sobre Serviços – ISS). Essa convicção, por força do artigo 103-A da Constituição, deve ser adotada obrigatoriamente por toda a Administração Fazendária e pelo Poder Judiciário.
A frase que resume o entendimento da referida Súmula Vinculante 31 é a seguinte: É inconstitucional a incidência do ISS – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – sobre operações de locação de bens móveis.
Obviamente, a frase é uma síntese do ponto de vista do Supremo Tribunal Federal (STF). Esse posicionamento tornou-se cada vez mais claro ao longo dos anos, como se pode constatar nos seguintes processos: AI 758.697 AgR/RJ, ARE 656.709 AgR/RS, AI 854.553 ED/MG, Rcl 14.290 AgR/DF, Rcl 28324/SC, RE 449.516 AgR/MG, dentre outros.
Para o nosso tema, consolidou-se no Supremo Tribunal Federal (STF) o entendimento de que, na maioria das situações, o Imposto sobre Serviços (ISS) incide integralmente na operação. Isso ocorre sempre que houver uma atividade com natureza de cessão ou locação em conjunto com a prestação de serviços, desde que estejam indissociavelmente misturadas. No entanto, quando essas atividades estiverem apartadas, com cobrança diferenciada e com objeto e discriminação claramente distintos, o ISS incidirá apenas sobre os serviços, sem alcançar a locação ou cessão de bens.
Independentemente de a atividade de locação envolver bens móveis ou imóveis, é importante destacar que, quando a locação está separada e não se mistura com a prestação de serviços, não há incidência de Imposto sobre Serviços (ISS). Essa conclusão foi reforçada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do AI 854.553 ED/MG. Vale ressaltar que a locação ou cessão remunerada é considerada um fato gerador de tributos da União, não dos municípios, conforme decidido no caso do RE 634.764/RJ.
2. A Oportunidade de Restituição
Seguindo a linha do raciocínio do tópico anterior, em um recinto alfandegado, é notável que os usuários buscam principalmente o espaço para armazenar mercadorias até o desembaraço aduaneiro. Essa busca, muitas vezes, decorre de obrigações legais, como previstas no Decreto-Lei 37/66 e na Instrução Normativa RFB 1.702/17. Trata-se do chamado “depósito necessário”, que geralmente é imposto por normas regulatórias (conforme o artigo 647 do Código Civil). No entanto, mesmo nesses casos, a exceção de não tributação pelo ISS se aplica apenas às atividades que possuem natureza de cessão ou locação e que estejam claramente dissociadas dos serviços.
Recuperação de Valores Pagos Indevidamente: Muitas empresas podem ter efetuado pagamentos de ISS além do devido, seja por erro na apuração ou por desconhecimento de seus direitos tributários. A revisão minuciosa dos registros contábeis e fiscais pode identificar esses valores indevidos e possibilitar sua recuperação.
Desde 2012, essa exceção tornou-se claramente verificável: a dissociação entre a prestação de serviços e a locação ou cessão de espaços para a estadia de mercadorias até o desembaraço aduaneiro. Em situações específicas como essas, a chamada “armazenagem” é, na verdade, essencialmente uma locação, e não apenas um rótulo ou apelido.
Com efeito, para reforçar minhas alegações, cito um artigo do Dr. Robinson Vieira que apresenta dois cases de sucesso:
“Os dois casos reais que merecem destaque, em início de abril de 2024, data deste artigo, estão discutidos nos processos de nos 0715535-20.2012.8.04.0001 e 0715529-13.2012.8.04.0001, ambos iniciados em Manaus/AM, na origem distribuídos para a 2ª vara da Dívida Ativa Municipal de Manaus, no ano de 2012. Referem-se a recintos alfandegados (porto seco e fluvial), justamente nos quais a locação não está baralhada com os serviços, ao contrário, encontra-se totalmente dissociada, seja em sua identificação, seja em seu objeto ou mesmo em sua cobrança. “- Dr. Robinson Vieira, advogado tributarista.
Sendo assim, “armazenagem”, especificamente nos referidos portos, tem a clara natureza de cessão remunerada de espaço para estadia de mercadorias em contêineres até o desembaraço aduaneiro, ou seja, locação de espaço, distinta dos serviços.
Como mencionado anteriormente, esses processos tiveram início em 2012 e, atualmente (início de abril de 2024), ainda estão em andamento. Se não ocorrerem eventos incomuns, eles serão concluídos exclusivamente no Supremo Tribunal Federal (STF). Esses processos fundamentam-se unicamente na Constituição e na Súmula Vinculante 31 dessa corte constitucional.
Independentemente do desfecho desses processos, o ponto crucial já está estabelecido, como aponta o ilustre advogado tributarista Robinson Vieira:
“O fato concreto já recebeu análise do Poder Judiciário competente, que unanimemente reconheceu o afastamento do ISS da parte correspondente à locação de espaços nos recintos alfandegados, independentemente de tal locação ser denominada por armazenagem, aplicando ao fato o entendimento do STF. É isso que pode ser aproveitável por todos os portos, desde que estejam em igualdade de condições!”- Dr. Robinson Vieira, advogado tributarista.
Portanto, não há dúvida sobre a tributação indevida no caso em tela e sua possibilidade de restituição.
4. Conclusão
Com a entrada em vigor da reforma tributária, o Imposto sobre Serviços (ISS) deixará de existir, eliminando a necessidade de debatê-lo. Portanto, este é o momento oportuno para pleitear judicialmente a recuperação do ISS pago a mais nos últimos cinco anos. Além disso, essa medida resultará em redução significativa da carga tributária atual. A reforma propõe a separação, na base de cálculo do ISS, entre os serviços e a locação mensal, que é comumente denominada como “armazenagem”, conforme explicado anteriormente.
A recuperação de créditos tributários é um direito fundamental dos contribuintes e, ao mesmo tempo, uma estratégia financeira inteligente. Quando uma empresa identifica que pagou tributos a mais do que o devido, a recuperação desses valores não apenas restabelece a justiça fiscal, mas também proporciona benefícios significativos.
Primeiramente, a recuperação de créditos tributários permite que a empresa capte recursos próprios que estavam indevidamente retidos. Esses recursos podem ser reinvestidos na operação, fortalecendo o caixa da empresa e viabilizando novos investimentos.
Além disso, ao recuperar créditos tributários, a empresa aumenta sua competitividade no mercado. Com uma carga tributária mais justa e recursos disponíveis, ela pode oferecer melhores condições aos clientes, investir em inovação, expandir suas atividades e até mesmo reduzir preços, tornando-se mais atrativa para os consumidores.
Por Dr. Jonathan Ferrari.
Referência: MIGALHAS. Armazenagem em Porto Seco e Aquático pode não ser tributada pelo ISS.